quinta-feira, 11 de julho de 2013

Perdendo o futuro

O filósofo Mark Rowlands escreve a respeito da morte em Scifi = scifilo, e discute se ela pode ser ruim por nos privar de algo que almejamos boa parte de nossa vida, e de coisas para as quais dedicamos muitos de nossos esforços. Alguém que tem uma vida orientada para o futuro, argumenta Rowlands, tem o que ele chama de um “futuro forte”. Um sujeito que não investe em seu futuro, e não se preocupa com ele, tem, por sua vez, um “futuro fraco”. Rowlands usa os dois termos para apresentar algumas de suas ideias sobre a morte. O autor, em O Filósofo e o Lobo, obra escrita posteriormente à Scifi = scifilo, descarta boa parte das coisas que escreveu sobre os futuros fraco e forte. A convivência com o lobo Brenin parece ter feito Rowlands reconsiderar a ideia de que a morte não é, por si só, ruim para os animais, indivíduos que ele imaginava possuírem um futuro fraco. O trecho abaixo foi extraído do livro Scifi = scifilo:

A morte é uma coisa ruim porque nos priva de um futuro. Todavia, vemos agora que é possível ter um futuro de duas maneiras diferentes, uma forte e outra fraca. Isto faz diferença para o caráter danoso ou ruim da morte? Seria a morte pior para alguém que possui um futuro forte que para alguém que só tem um futuro fraco?
        Acredito que sim. Alguém que possui um futuro forte, orientando muito de seu comportamento presente e disciplinando muitos de seus desejos presentes rumo a uma concepção de como esta pessoa quer que seu futuro seja, é mais fortemente ligado ao seu futuro que alguém que tem apenas um futuro fraco. Logo, uma pessoa que tem um futuro forte tem mais a perder, ao perder um futuro, que uma pessoa que possui apenas um futuro fraco.
        Se isto não ficou claro, considere o exemplo seguinte: duas pessoas vão às Olimpíadas competir no triatlo. Uma delas treinou por anos, orientou sua vida, organizou seu comportamento e disciplinou seus desejos para atingir esse objetivo. A outra é uma atleta preguiçosa e incapaz que chegou aos jogos olímpicos, vamos supor, através de um erro de identificação. Nenhuma das duas ganha uma medalha. Às vezes falamos que alguém “perdeu” a medalha. Se isto é realmente uma perda, então aparentemente a perda maior é sofrida pela primeira atleta, já que ela organizou sua vida ao redor desta meta. Muito de sua vida foi vivida por causa deste objetivo futuro, que ela não atingiu. Ela tinha claramente mais dela mesma investido em conseguir a medalha que a outra atleta. Logo, sua perda é maior.
        Estou argumentando de maneira semelhante ao prejuízo envolvido em perder um futuro. Quanto mais você tiver investido no futuro, julgando em termos de organização, orientação, disciplinamento e arregimentação de seu comportamento e desejos presentes, mais você perde quando perde tal futuro. Se você tem um futuro num sentido conceitual, ou forte, então, quando você morre você perde mais do que se você possuísse um futuro apenas no sentido fraco, não-conceitual. A morte é um prejuízo maior para aqueles que têm um futuro forte, pois na morte eles perdem mais que aqueles que possuem um futuro apenas fraco.



Extraído de ROWLANDS, M. Scifi = scifilo: a filosofia explicada pelos filmes de ficção científica. Rio de Janeiro: Relume, 2005.

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