sábado, 26 de fevereiro de 2011

Bilhões e Bilhões

Por Guilherme

O astrônomo americano Carl Sagan, falecido em 1996, tornou-se uma das figuras mais populares da ciência devido às suas obras de divulgação científica, como a série Cosmos, e seus vários livros e artigos sobre assuntos relacionados à cosmologia. Seu livro mais famoso é a ficção Contato, publicada em 1985, uma história sobre o contato humano com uma forma de vida mais avançada, extraterrena. O livro foi adaptado para o cinema em 1997, embora o resultado não tenha feito justiça à qualidade da obra de Sagan.
Dos livros de Sagan que tive a oportunidade de ler, meus preferidos são O Mundo Assombrado Pelos Demônios: a ciência vista como uma vela no escuro (Companhia de Bolso, 2006) e Bilhões e Bilhões: reflexões sobre vida e morte na virada do milênio (Companhia de Bolso, 2008). O primeiro é considerado um dos grandes clássicos do pensamento cético, algo como um manual do racionalismo científico. Nele, Sagan analisa histórias extraordinárias, como aparições de fantasmas, de extraterrestres, e a possibilidade da vida após a morte. Uma célebre frase reflete a linha de pensamento do autor em O Mundo Assombrado Pelos Demônios: alegações extraordinárias requerem provas extraordinárias. E Sagan analisa essas alegações com grande competência, de modo semelhante ao que fazem hoje cientistas como Michael Shermer e Richard Wiseman.
Bilhões e Bilhões é o livro mais pessoal de Sagan. A obra é dividida em 19 capítulos, e traz as ideias do autor sobre temas que eram raramente tratados por ele, como o aquecimento global, o aumento populacional humano, a guerra fria, o aborto, e os códigos morais de nossa sociedade, além, obviamente, da astronomia.
No décimo sexto capítulo, As Regras do Jogo, Sagan fala sobre moralidade, um assunto frequentemente evitado por cientistas. O astrônomo discute algumas das máximas morais humanas, entre elas a Regra de Ouro, atribuída a Jesus de Nazaré (“faz aos outros o que desejas que te façam”) e a Regra de Prata (“não faça aos outros o que não desejas que te façam”). Dos códigos morais tradicionais, chega-se ao famoso “dilema do prisioneiro” (para conhecê-lo, acesse aqui), utilizado em estudos econômicos e também na biologia evolutiva, que considera o peso dos interesses individuais em uma decisão moral.
O último capítulo, No Vale da Sombra, mostra a luta de Sagan contra um raro tipo câncer, que acabaria por tirar a sua vida. Apesar da gravidade da situação, a doença fez Sagan refletir sobre a sua vida sem nenhum tipo de “wishful thinking”, como ele mesmo escreveu. Assim, enfrentou o seu drama sem se fiar a esperanças em vida após a morte ou em receber um bilhete para o paraíso. E lutou até o final com esse pensamento:

O mundo é tão refinado, com tanto amor e profundidade moral, que não há razões para nos enganarmos com histórias bonitas, para as quais não há muitas evidências. A meu ver, em nossa vulnerabilidade é muito melhor encarar a morte de frente e agradecer todos os dias pela oportunidade breve, mas magnífica, que a vida nos concede.”

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

A educação em nosso país, sinal de que estamos quase no primeiro mundo

Por Guilherme

Há alguns anos, nossos governantes insistem em dizer que estamos a caminho do que antigamente se chamava de primeiro mundo. Somos quase um país desenvolvido, quase no mesmo nível de nações como Noruega e Dinamarca. Nunca levei essa história muito a sério, afinal sou mais um brasileiro com a terrível mania de "depreciar" aquilo que é nosso. Mas o que tenho visto e ouvido sobre as condições do sistema educacional brasileiro provam que eu estava errado. Somos, sim, uma nação de primeiríssimo mundo, que se preocupa com aquilo que realmente importa e dá valor àquilo que é necessário para que um país se desenvolva. E percebemos isso olhando para nossas escolas. Duvida? Dá uma olhada nas notícias abaixo:

O que a leitura nos proporciona

Por Guilherme

Tirei de minha estante o livro Com Uma Perna Só (Companhia das Letras, 2003), do neurologista americano Oliver Sacks, para reler alguns trechos dessa obra que narra um acidente sofrido por Sacks, que fez do médico um paciente. O livro é finalizado com a citação de um famoso trecho do poema Little Gidding, de T. S. Eliot, que pode ser aplicado para uma série de situações de nossas vidas, mas que se encaixa perfeitamente se usado para descrever nossa sensação depois da leitura de um bom livro:

E o fim de toda a nossa exploração
Será chegar ao lugar de onde partíramos
E conhecer o lugar pela primeira vez.

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Quando não é possível distinguir ficção e realidade

Por Guilherme

Livros, ou filmes, inspirados ou baseados em histórias reais geralmente abusam da liberdade de criação e distorcem completamente a história original. Alguns fazem isso propositalmente, como na bizarra série de filmes O Massacre da Serra Elétrica, "inspirada" na vida de Ed Gein, um psicopata americano que sequer chegou perto de fazer o que Leatherface fazia às suas vítimas. Desse modo, o exagero se constitui em um modo interessante de chamar a atenção do público para a obra. Mas existem poucas histórias que só podem ser contadas de modo mais suave, pois são potencialmente perigosas para quem as conta e para aqueles envolvidos nelas.
Terminei recentemente a leitura de Elite da Tropa (Objetiva, 2008), de Luiz Eduardo Soares, André Batista e Rodrigo Pimentel. A obra é apresentada como um relato fictício, inspirada em eventos reais, sobre a ação do Batalhão de Operações Especiais (BOPE) nas favelas do Rio de Janeiro. O enredo da história é conhecido por quem já assistiu aos filmes Tropa de Elite 1 e 2: as sessões torturantes de treinamento dos homens do pelotão, perigosas incursões noturnas por favelas dominadas por traficantes, violência policial, o papel do usuário na manutenção do esquema do tráfico, corrupção policial e formação de milícias, etc. O livro traz uma visão idealizada do BOPE (comprada até pela revista Veja), como um batalhão incorruptível, eficiente e violento. E é essa a visão do Batalhão que o temos ao assistir aos filmes e ler o livro.
Infelizmente, notícias recentes (veja aqui e aqui) mostram que a história pode não ser exatamente essa. Aos que vivem no mundo real, resta perguntar: em quem se pode confiar?

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

As ideias de Darwin

Por Guilherme

Nas próximas semanas, publicaremos posts sobre livros de diferentes áreas do conhecimento, como psicologia, biologia, medicina e filosofia, que possuem um ponto em comum: foram todos inspirados nas ideias de seleção natural de Charles Darwin.
O vídeo abaixo, chamado Dancem, Macacos, Dancem, foi produzido originalmente pelo americano Ernest Cline, e mostra a nossa vida sob o ponto de vista darwiniano. Afinal, como escreveu o jornalista americano Robert Wright, também somos animais, mas a nossa espécie é a dos "animais morais".


quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Mente e Cérebro

Por Guilherme

Mente e Cérebro: dez experiências impressionantes sobre o comportamento humano (Ediouro, 2004), de Lauren Slater, é um dos melhores livros populares sobre psicologia. A autora, que é psicóloga, descreve o que ela considera os trabalhos mais interessantes sobre nosso comportamento. O livro é dividido em dez capítulos, e inicia com a vida e obra de um dos mais conhecidos e polêmicos psicólogos, B. F. Skinner, famoso por seus estudos que enfocavam a aprendizagem em ratos e pombos. O livro segue com dois dos mais incríveis estudos psicológicos contemporâneos, o trabalho de Stanley Milgram sobre a obediência a autoridade (outro grande trabalho de Milgram foi o chamado “mundo pequeno”) e o de David Rosenhan que questiona a precisão do diagnóstico psiquiátrico. Os estudos de John Darley e Bibb Latané sobre a difusão de responsabilidade, comentada por Richard Wiseman em 59 Segundos, aparecem no quarto capítulo. Leon Festinger e seus experimentos sobre a “dissonância cognitiva”, e os criticados procedimentos de Harry Harlow com macacos rhesus, enfocando a psicologia do afeto, compõem os capítulos 5 e 6 do livro de Slater.
O sétimo capítulo trata da natureza do vício, tema estudado por Bruce Alexander em ratos. Os dois capítulos seguintes discorrem sobre a memória humana, com os estudos de Elizabeth Loftus sobre a falsa memória e os de Eric Kandel sobre a natureza dela. O livro termina com uma breve retrospectiva dos procedimentos cirúrgicos cujo objetivo é modificar o comportamento do paciente, como a lobotomia.
Mente e Cérebro não é simplesmente um livro que descreve os experimentos psicológicos mencionados acima. Além disso, Slater trata da história pessoal de boa parte dos pesquisadores e do contexto de seus trabalhos. Para quem gosta de ter contato com ideias extraordinárias, essa obra é leitura obrigatória.

Links:
Artigo de David Rosenhan, On Being Sane in Insane Places (em inglês)
Página da professora Elizabeth Loftus, que disponibiliza seus artigos científicos (em inglês)
Informações sobre o experimento da "prisão de Stanford", feito por Philip Zimbardo, que não está no livro de Slater mas é um dos estudos psicológicos mais discutidos nas últimas décadas.

A vida antes da morte

Por Guilherme

Estive recentemente em uma livraria de Caxias do Sul, e lá havia um cartaz bastante interessante. O cartaz anunciava a sessão de autógrafos de um livro espírita, e o discurso era mais ou menos o seguinte: é certo que há algo bom depois da morte e, por isso, não havia necessidade de sofrer por perder um ente querido.
Não sou espírita, e não acredito que exista algo semelhante à vida depois da morte. Tudo o que temos de relevante é o que nos acontece aqui, agora. Como disse André Comte-Sponville, o que vivemos aqui é tudo o que temos. Mas não escrevo esse post como uma crítica às ideias do espiritismo, pois pode ser que elas estejam corretas. Escrevo esse post para compartilhar uma crônica recente da Martha Medeiros na Zero Hora, que fala daquilo que realmente nos importa, a vida antes da morte. O texto está disponível aqui.

Projeto Gutenberg

Por Guilherme

O Projeto Gutenberg é uma biblioteca digital fundada em 1971, fruto de um esforço de voluntários para disponibilizar livros gratuitamente, em diversos idiomas. A biblioteca dispõe de mais de 33 mil livros, de autores consagrados como Kafka, Thoreau, Agatha Christie, James Joyce, Allan Poe, Charles Dickens, Conan Doyle e Jane Austen. Em português, é possível encontrar obras de Machado de Assis, Simões Lopes Neto e Luiz de Camões, entre outros.
A maioria dos livros disponíveis no site é de domínio público, e pode ser baixada em qualquer computador. O endereço do site, em português, é http://www.gutenberg.org/wiki/PT_Principal

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

59 Segundos

Por Guilherme

Nunca fui fã de livros de autoajuda por considerá-los muito banais, cheios de sugestões simplórias que, ditas por pessoas comuns, não fariam muito sucesso. Quando essas obviedades são ditas pelos “gurus”, entretanto, elas tomam a forma de grandes conselhos para a felicidade e a realização pessoal e profissional. Verdadeiros milagres. Recentemente, assisti a um programa onde um dos mais famosos “gurus” brasileiros dava dicas sobre como resolver problemas cotidianos. Uma senhora mandou uma mensagem de socorro, porque não aguentava mais a postura de seu genro quando ele a visitava: o rapaz chegava e logo se acomodava no sofá, ligava a televisão e ainda pedia para ela buscar uma bebida na geladeira! O conselho do “guru” foi extraordinário, algo realmente fora do comum, que certamente deve ter mudado a vida dessa senhora para sempre: “a senhora precisa dizer a ele que ele é um folgado!” Depois disso, entendi porque o especialista cobra mais de 20 mil reais por uma palestra. São poucos os sujeitos tão sábios.
Assim, não preciso dizer que dificilmente me interessaria por um livro intitulado 59 Segundos: pense um pouco, mude muito (BestSeller, 2011). Mas decidi comprá-lo porque sou fã de seu autor, Richard Wiseman, e que, por isso, sabia que o livro não seria um amontoado de besteiras.
59 Segundos, na verdade, é quase a anti-autoajuda. Ao invés de dar conselhos guiados pelo senso comum ou fórmulas batidas, Wiseman se dispôs a procurar na literatura científica trabalhos que enfocassem os temas mais comuns da autoajuda, mas com um bom embasamento (para ter uma ideia da extensão da pesquisa do autor, basta dar uma olhada no final do livro e verificar a bibliografia utilizada por ele). Os dados das pesquisas citadas por Wiseman algumas vezes desafiam o senso comum. Por exemplo, a técnica do brainstorming, na qual um grupo é reunido e se pede às pessoas para que apresentem livremente suas ideias para ajudar a resolver algum problema, sempre foi considerada um procedimento padrão de grandes empresas quando elas estão à procura de ideias inovadoras. Wiseman explica que isso não é necessariamente verdade, e que pessoas que trabalham em grupo podem produzir menos, por apresentar a chamada “vadiagem social”, ou seja, elas se esforçam menos porque imaginam que a responsabilidade esteja dividida igualmente entre os integrantes do grupo, e assim não há pressão por resultados individuais.
Mesmo que alguns dos resultados apresentados por Wiseman sejam baseados em poucos estudos, e que pareçam contra-intuitivos, é inegável que a ciência tem muito a contribuir para o bem-estar humano, dando dicas importantes de como podemos agir em situações do dia-a-dia, interpretar as nossas próprias ações e, mais importante, as dos outros.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Achei Que Meu Pai Fosse Deus

Por Guilherme

O escritor norte-americano Paul Auster é famoso por seus ensaios e obras de ficção. Em Achei Que Meu Pai Fosse Deus e outras histórias verdadeiras da vida americana (Companhia das Letras, 2005), o autor transfere o papel de narrador a seus conterrâneos, ouvintes do programa que Auster apresentou em uma rede americana de rádio. A ideia original era que as pessoas enviassem a Auster histórias sobre eventos ocorridos em suas vidas para que elas fossem lidas ao vivo no programa. Os relatos deveriam ser verdadeiros, mas não de situações comuns. Deveriam ser “histórias que desafiassem nossas expectativas em relação ao mundo, casos que revelassem as forças misteriosas e incognoscíveis que atuam em nossa vida”. A iniciativa foi tão bem sucedida que virou um livro.
Achei Que Meu Pai Fosse Deus contém relatos de pessoas de diferentes profissões e classes sociais, que tratam de temas distintos, como a família, o amor, animais, a morte, a felicidade, encontros e desencontros, entre vários outros. A dramaticidade e a imprevisibilidade de algumas das histórias nos mostram porque os acontecimentos reais são, na maioria das vezes, muito mais interessantes do que o mais bem elaborado texto de ficção.

- Nesse link para o site da Revista Veja é possível ler duas histórias do livro.
- Outra iniciativa semelhante é a do site This I Believe, que traz ensaios feitos por pessoas de várias partes do planeta. Além disso, há uma área do site na qual o internauta pode enviar a sua própria história.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

Livros acadêmicos gratuitos

Por Guilherme

A The National Academies Press mantém um site no qual disponibiliza gratuitamente (e legalmente) diversos livros técnicos, em inglês, para usuários que vivam em países em desenvolvimento, como o nosso. Acessando o site da editora você tem a disposição livros acadêmicos de medicina, meio ambiente, informática, engenharia, biologia, pedagogia e de outras áreas do conhecimento. Para fazer o download do livro, você deve selecioná-lo e preencher um pequeno cadastro. Nem todos os livros expostos podem ser copiados livremente, mas vale a pena visitar o site pois há um bom número de obras disponíveis sem custo.

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Comprar, descartar, comprar...

Por Guilherme

Você já se perguntou porque a sua impressora ou celular quebram em pouco tempo? Muita gente desconfia que esses produtos, e outros eletrônicos, têm sua vida útil reduzida para que os consumidores se obriguem a trocar os aparelhos com defeito por novos. Até agora, ninguém tinha abordado a questão com propriedade, mas a emissora espanhola RTVE decidiu mexer na ferida. Seu documentário Obsolescencia programada ou Comprar, tirar, comprar mostra porque, na visão empresarial, "um produto que não se desgasta é uma tragédia para os negócios".

Documentário completo

O documentário também pode ser visto na página da RTVE, com informações adicionais.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Neil Diamond, uma lenda viva da música

Por Guilherme

No último dia 24, um dos maiores cantores da história do rock virou um septuagenário. Neil Diamond, o americano dono de uma das vozes mais belas e limpas da música contemporânea, é autor de músicas memoráveis, como Sweet Caroline, Red Red Wine, Forever in Blue Jeans, Holly Holy, I’m a Believer, Girl, You’ll be a Woman Soon, Solitary Man, Song Sung Blue, Cracklin’ Rose, I Am... I Said, Kentucky Woman, Done Too Soon, Hell Yeah, September Morn e Heartlight, entre outras. Seu último álbum ao vivo, Hot August Night/NYC 2008 (o terceiro com o mesmo título, os dois primeiros foram lançados em 1972 e 1987) não deve faltar na coleção de nenhum fã do rock clássico, e mostra Diamond com uma vitalidade impressionante.
Ao que parece, a idade não interfere nos planos de Diamond para novas turnês. Em 2011, estão confirmados shows na África do Sul e na Nova Zelândia. Tomara que ele decida esticar a estada no hemisfério sul e passe pelo Brasil também.

Cracklin’ Rose


Heartlight


I’m a Believer


O Filósofo e o Lobo

Por Guilherme

Se alguém nos pedisse para associar algum animal à palavra “lealdade”, os cães certamente viriam à cabeça da maioria. Afinal, vemos neles boa parte daquilo que nos falta, especialmente a fidelidade a nossos amigos e a incapacidade de mentir, dissimular e de esconder os piores sentimentos. “O melhor amigo do homem” é muito mais do que um simples rótulo.
Para o filósofo galês Mark Rowlands, seu maior amigo não era um cão, mas um lobo. E Brenin, o lobo, animal que é comumente tratado como vilão na maioria das histórias em que aparece, marcou profundamente a vida de Rowlands, modificando a visão do autor sobre temas como a felicidade, o sentido da vida, e a morte. As memórias de seus anos de convivência com o enorme Brenin estão em O Filósofo e o Lobo: lições da natureza sobre amor, morte e felicidade (Objetiva, 2010).
Escrito por um filósofo, para leigos, O Filósofo e o Lobo narra acontecimentos relevantes da relação de Rowlands com seu lobo para discutir como esses eventos moldaram definitivamente a vida do autor. A primeira lição foi a firme disciplina imposta pelo filósofo para que seu companheiro não destruísse completamente a casa onde moravam. De acordo com Rowlands, a disciplina não se opõe de nenhuma maneira à liberdade, mas a torna possível. Sem disciplina não há liberdade, somente licenciosidade. Pena que poucos tenham consciência disso.
O Filósofo e o Lobo é um livro escrito de modo brilhante e cheio de grandes reflexões. Há pensamentos grandiosos sobre vários temas e referências a importantes pensadores, como Nietzsche e John Rawls (vale a pena passar algum tempo refletindo sobre as implicações da ideia da “posição original”, desenvolvida por esse autor). É difícil selecionar a melhor passagem do livro, mas uma de minhas preferidas é essa:

“Mas existe outra forma, mais profunda e importante, de nos lembrarmos: uma forma de lembrança que ninguém jamais pensou em honrar com um nome. Trata-se da recordação de um passado que se imprimiu em nós, em nosso caráter e na vida que levamos – e que molda esse caráter. Não temos, normalmente, consciência dessas lembranças; muitas vezes nem são coisas que estão em nosso consciente. São elas, mais que qualquer outra coisa, que fazem de nós o que somos. Essas lembranças se manifestam nas decisões que tomamos, nos atos que praticamos e na vida que levamos.
            É em nossas vidas, e não, fundamentalmente, em nossas experiências conscientes, que encontramos as lembranças dos que se foram. Nossa consciência é instável, não é digna do trabalho de se lembrar. O modo mais importante de se lembrar de alguém é ser a pessoa em que esse alguém nos transformou – pelo menos em parte – e viver a vida que ele nos ajudou a moldar. Às vezes, ele não merece ser lembrado. Nesse caso, nossa tarefa existencial mais importante é removê-lo da narrativa de nossas vidas. Mas, quando ele merece ser lembrado, levarmos uma vida que ele ajudou a moldar não é apenas um modo de nos lembrarmos dele; é como honrarmos sua memória.”

- Clique aqui para ler uma entrevista do autor ao jornal O Estado de São Paulo.