terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Para Que Serve Tudo Isso?

Por Guilherme

Terminei ontem a leitura de Para Que Serve Tudo Isso? – a filosofia e o sentido da vida, de Platão a Monty Python (Zahar, 2008), do filósofo inglês Julian Baggini. A obra apresenta uma discussão racional sobre quais aspectos de nossa vida podem realmente dar sentido (ou não) a nossa existência. Um dos capítulos é dedicado ao tema “sucesso” porque, de acordo com o autor, muitas pessoas acreditam que uma vida profissional e financeiramente bem sucedida basta para tenhamos uma existência plena. Em um trecho do capítulo, Baggini questiona a validade dos ensinamentos da maioria dos chamados livros de autoajuda, com uma argumentação bastante pertinente.

Acho que a proliferação desses livros só foi possível porque eles tocam em um desejo quase universal dos seres humanos de desenvolvimento pleno de potencial. A relação entre esses livros e o que eu tenho dito é que as pessoas querem, sim, ser alguém e, com isso, dar sentido às suas vidas. Contudo, o que me preocupa é que esses livros podem estar usando esse desejo e canalizando-o para direções pouco produtivas.
        Por exemplo, eles podem prometer a felicidade. Tudo bem, mas como vimos no capítulo anterior, a felicidade não é tudo, e, se você fizer da busca da felicidade a principal questão da sua vida, é bem provável que não a consiga. Eles também podem prometer o sucesso, mas podem focar somente no sucesso palpável, ao passo que o sucesso de verdade é o desenvolvimento interior. Esses livros podem prometer coisas demais de maneira exageradamente fácil, ignorando que o tornar-se é uma forma de luta. (Apesar de que, nem sempre, é uma luta desagradável.) Eles podem apresentar o desenvolvimento pessoal como um meio para se chegar a determinado fim – reconhecimento, admiração e sorrisos abertos –, quando na verdade ele deveria ser um fim em si mesmo.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Eu Mato

Por Natália

Quando Jean-Loup Verdier, DJ de uma rádio de Montecarlo, recebe um estranho telefonema de um ouvinte, todos imaginam estar diante de um louco perturbado, mas não de um assassino. Porém, assim que a ameaça anunciada na rádio se confirma – duas pessoas são encontradas mortas em um barco, sem a pele do rosto –, a população, a polícia e o governo do principado ficam desnorteados. Logo, novas ameaças surgem, sempre da mesma forma: o assassino liga para o programa de Jean-Loup, conversa um pouco com o apresentador e, por fim, deixa tocar uma música, a qual, depois se descobre, tem alguma relação com o crime que está prestes a ser cometido. Na cena do crime, há sempre uma espécie de ritual: após a morte da vítima, o criminoso retira a pele de seu rosto e deixa escrito, com sangue, a frase Eu mato.
        Mesmo com a ajuda do agente do FBI Frank Ottobre, a polícia se vê incapaz de solucionar essa série de mortes. Quando, porém, parece que a única alternativa possível é esperar que o assassino estabeleça novo contato e anuncie que irá matar de novo, Frank e seus colegas percebem que o serial killer cometeu um pequeno erro, deixando-lhes uma pista para a resolução do caso.
        Eu Mato (Intrínseca, 2010), do italiano Giorgio Faletti, é um romance policial ágil e cheio de reviravoltas. Nos primeiros dois terços da obra, o autor deixa o leitor esperando avidamente pelos próximos crimes e pelas eventuais pistas que o assassino poderá deixar. Na última parte, quando já se conhece a identidade do serial killer, a expectativa concentra-se em torno dos meios utilizados pela polícia para encontrá-lo e capturá-lo. Eu mato é uma obra policial instigante, escrita num ritmo tão acelerado que faz com que suas mais de 500 páginas sejam devoradas com muita rapidez. A série de crimes, a pouca quantidade de pistas e a sensação de que a polícia e o povo de Montecarlo estão nas mãos do psicopata são os ingredientes que fazem com que o leitor se prenda à trama e queira descobrir logo como todo o mistério é desvendado.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Ética & Animais: um guia de argumentação filosófica

Por Guilherme

Já apresentamos aqui diversos livros que tratam das questões éticas que envolvem as relações dos seres humanos com outros animais. Libertação Animal, de Peter Singer, é uma obra pioneira nesse campo, e Singer foi um dos primeiros pensadores a fazer do problema da exploração animal um campo de discussão sério na filosofia. Comer Animais, de Jonathan Safran Foer, mostra o problema sob outro ponto de vista. Foer visitou matadouros americanos, conversou com criadores e defensores dos direitos animais, conheceu as condições nas quais os animais de criação são mantidos, e chegou a uma conclusão semelhante a de Singer: é um crime utilizarmos animais do modo como o fazemos hoje.
        Para quem deseja saber mais sobre o tema, ou gostaria de ler um bom livro introdutório, uma ótima indicação é Ética & Animais: um guia de argumentação filosófica (Edipucrs, 2006), do filósofo brasileiro Carlos Naconecy.
        Ética & Animais é organizado de modo a atender os interesses de todos os tipos de leitores, sejam eles versados em filosofia ou não. Naconecy apresenta conceitos filosóficos de modo direto e acessível, e discorre sobre os mais comuns erros de argumentação que aparecem quando tratamos de um determinado assunto. O conhecimento das falácias será a base para refutar, posteriormente, a maioria (se não todos) dos argumentos contrários à noção de que temos deveres morais em relação aos animais não humanos.
        A obra também nos permite entender com maior detalhe os principais argumentos favoráveis à maior consideração dos interesses dos animais, e isso ocorre quando Naconecy aponta as inconsistências da visão de mundo especista (que considera que somente os seres humanos são ‘pacientes morais’, ou seja, seres que devem ter seus interesses respeitados e levados em consideração). Além disso, o autor resume as ideias de pensadores como Peter Singer, Tom Regan e Richard Ryder, importantes nomes na luta pela elevação do status moral dos animais.
        A parte final de Ética & Animais descreve as condições nas quais os animais de criação vivem no confinamento. Para quem imagina que a tecnologia trouxe benefícios ao bem-estar animal, o relato de Naconecy é revoltante. A condição “normal” para animais confinados é uma vida inteira de sofrimento, com membros amputados ou mutilados, e espaços minúsculos que mal permitem a livre movimentação. Se isso não basta para reconsiderarmos nossas ideias em relação aos animais não humanos, não sei o que pode nos motivar a isso.
        Ética & Animais é uma obra primorosa. Não bastasse isso, é também um trabalho muito importante. A situação dos animais sob nosso domínio reflete algumas das ocasiões em que o ser humano demonstrou o seu pior lado, explorando os indivíduos mais fracos com a terrível justificativa de que eles não tinham quaisquer direitos e sequer mereciam um bom tratamento. Já vimos isso nas épocas da escravidão e do nazismo. O escritor Isaac B. Singer percebeu isso: “Com relação aos animais, todas as pessoas são nazistas.

OBS: Uma nova edição da obra de Naconecy está em andamento. O livro não se encontra mais disponível em livrarias, mas pode ser obtido, em versão eletrônica, diretamente com o autor. Para entrar em contato com Naconecy, escreva para naconecy@terra.com.br

domingo, 22 de janeiro de 2012

Frase interessante

Por Guilherme

A frase abaixo é atribuída ao poeta alemão Friedrich Hölderlin, e está no topo do blog Contemplações; improvisos, de Luciano Mallmann. Infelizmente, creio que o poeta alemão tinha razão.

"O homem é um Deus quando sonha, e não passa de um mendigo quando pensa."

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Equador

Por Natália

A nomeação de Luís Bernardo Valença, feita pelo rei de Portugal, para ser governador do longínquo território de São Tomé, em 1905, põe fim à vida boêmia e pouco responsável que Luís levava. Em São Tomé, uma ilha localizada na África, perto da Linha do Equador, Luís Bernardo tem de equilibrar-se entre as exigências dos trabalhadores e fazendeiros locais e as manobras do governo português. Tem de aprender a governar sob o sol escaldante, a lidar com os interesses de estrangeiros que passavam pela ilha e a sobreviver sem os luxos da metrópole. É em São Tomé que Luís Bernardo finalmente descobre o verdadeiro amor, quando se entrega a Ann, uma britânica nascida na Índia, casada com um inglês consumido pela sífilis e pela ganância.
      Equador (Nova Fronteira, 2004) é o primeiro romance do escritor português Miguel Sousa Tavares. A obra traz uma descrição detalhada da ilha de São Tomé e retrata ricamente a sociedade portuguesa (na metrópole e fora dela) dos últimos anos da Monarquia. É um livro que deve interessar os leitores que gostam da mescla de ficção com história real e também aqueles que apreciam assuntos ligados, de certa maneira, à própria história do Brasil.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Pirsig, mais uma vez

Por Guilherme

Minha irmã já me pediu se o único livro que li na vida foi Zen e a Arte da Manutenção de Motocicletas, de Robert Pirsig, tantas são as vezes que cito o livro ou discuto alguns de seus temas para quem tem paciência de escutá-los.
      Postei recentemente um pequeno texto no blog do Professor Daniel Blumstein a respeito de uma das passagens mais interessantes da obra, que fala da armadilha indiana para capturar macacos, e o que essa metáfora pode nos ensinar, nesse caso sobre o meio ambiente e a extração de recursos de nosso planeta. O texto no blog de Blumstein pode ser acessado aqui.
O post sobre o assunto aqui em nosso blog pode ser lido aqui.

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

A mercantilização da educação no Brasil

Por Guilherme

Nunca tive simpatia por posições políticas extremas. Não penso que o governo tenha que regular todos os aspectos da vida das pessoas, mas também não concordo com quem afirma que as pessoas devem ser totalmente livres em relação ao Estado. Creio que determinados serviços, como a saúde e a educação, mesmo quando oferecidos por instituições particulares, devam estar sob uma regulação rígida do Estado. Quando tratamos dessas questões estamos indo além do que é direito individual, e entramos na consideração de interesses da comunidade e do país. É um direito de todos ganhar dinheiro, ter uma boa vida e, também, enriquecer com o trabalho feito. No entanto, não vejo mérito algum na ação de alguém que cobra  por um serviço essencial, o executa de modo ruim e consegue manter um altíssimo padrão de vida com o lucro desse serviço mal feito.
        Posso estar vivendo em um mundo paralelo e romântico, mas não consigo aceitar que empresas que lidam com planos de saúde possam patrocinar clubes de futebol ao mesmo tempo em que cobram taxas abusivas de seus usuários e, não raramente, os abandonam ou prestam serviços de baixa qualidade quando os pacientes mais necessitam.
        Também não acredito que instituições educacionais possam funcionar como empresas, e colocar como seu objetivo principal o próprio lucro e o de seus acionistas em detrimento de um serviço educacional de boa qualidade. Enquanto partidários de PT e PSDB derramam acusações uns contra os outros em relação a quem é o culpado pela péssima qualidade da educação brasileira, eles deveriam se abraçar e chorar juntos, já que têm a mesma responsabilidade pela tragédia. Na época de FHC o governo incentivou a abertura de grupos educacionais privados, com regulações muito brandas, e o governo Lula (e o atual) manteve uma política parecida, nada fazendo contra os abusos dessas instituições. A situação chegou a ponto de encontrarmos faculdades que permitem que mais de cem alunos se empilhem na mesma sala, uma visão similar a de um depósito de pessoas, incompatível com o que imaginamos ser uma universidade. Talvez eu esteja cismado com isso, mas não me sujeitaria a uma operação com um médico advindo de tal “enturmação”, e também não permitiria que minha casa fosse elaborada por um engenheiro ou arquiteto que cursou uma instituição na qual a educação e a formação profissional estão em segundo plano.
        Discuto esse assunto no blog pois há alguns dias li um artigo muito interessante, escrito por uma professora da Universidade Federal do Pará, que trata da expansão de instituições financeiro-educacionais no Brasil, e discute algumas das consequências disso. O título do artigo é Expansão da privatização/mercantilização do ensino superior brasileiro: a formação dos oligopólios, e o texto pode (deve, eu diria) ser acessado aqui.