Por Guilherme
Na última década, vários livros foram lançados contestando os principais dogmas das religiões organizadas. Autores como Richard Dawkins (de Deus, um Delírio), Sam Harris (de Carta a Uma Nação Cristã), Christopher Hitchens (de Deus Não é Grande) e Daniel Dennett (de Quebrando o Encanto) decidiram tornar públicas as suas ideias sobre questões religiosas, explicando que se pode viver plenamente, e eticamente, sem seguir qualquer tipo de culto a um ser superior. O quarteto ateu foi massacrado por grupos religiosos, que perceberam que o incentivo ao livre pensamento não traria muitos benefícios para boa parte das religiões. Os nomes de Dawkins e de Dennett ainda estão tão ligados ao debate religioso que o principal foco de seus trabalhos nas áreas da biologia e da filosofia, respectivamente, quase não é discutido publicamente.
A maneira incisiva ao criticar alguns pontos da prática e do discurso religioso, principalmente nos escritos de Dawkins, Harris e Hitchens, fez com que poucas pessoas religiosas tivessem a disposição para ler obras de temática ateísta. E se alguém de fé tiver curiosidade de ler algo sobre o ateísmo, mas não quer se sentir ofendido pela veemência dos ataques à religião, O Espírito do Ateísmo, de André Comte-Sponville (Martins Fontes, 2007) é o livro mais indicado.
O Espírito do Ateísmo é dividido em três partes. Na primeira, Sponville afirma que podemos viver sem religião, e que a ética e o bom comportamento das pessoas não depende da crença em um ser superior. A segunda parte é dedicada a argumentos a respeito da existência (ou não) de um Criador. Sponville levanta ideias muito interessantes aqui, mas o item principal, no meu ponto de vista, serve mais como uma crítica às pessoas do que qualquer outra coisa: não é possível que um ser perfeito tenha como sua imagem e semelhança o ser humano:
“Quanto mais conheço a mim mesmo, mais difícil me parece acreditar em nossa origem divina. E quanto mais conheço aos demais, ainda considero isso difícil... Em algum lugar, escrevi que crer em Deus é um pecado de orgulho. Seria atribuir uma grande causa para um efeito tão pequeno. O ateísmo, ao contrário, é uma forma de humildade. Somos filhos da terra (húmus, de onde vem ‘humildade’), e isso se nota... Melhor assumir isso e inventarmos o céu que nos corresponde.”
A última parte do livro fala sobre a espiritualidade, um termo difícil de definir. Para o autor, uma vida repleta de espiritualidade é a vida que valoriza a sabedoria, a ética, a fidelidade à verdade e aos princípios e o amor. Espiritualidade é cultivar os bons sentimentos, e isso independe de crenças religiosas.
Comte-Sponville é conhecido por defender a busca por uma vida plena aqui na Terra, que é a única que temos com certeza. E em O Espírito do Ateísmo ele afirma isso novamente:
“É o amor, e não a esperança, que nos faz viver; é a verdade, e não a fé, que nos liberta.
Já estamos no Reino dos Céus: a eternidade é agora.”