sexta-feira, 11 de maio de 2012

Vida e Morte do Grande Sistema Escolar Americano

Por Guilherme

Entre os estudiosos contemporâneos das políticas educacionais, poucos são tão destacados quanto a americana Diane Ravitch. Ravitch trabalhou nos governos de George Bush (o pai) e Bill Clinton, escreveu inúmeros artigos e livros sobre educação e atuou como professora e pesquisadora em destacadas universidades americanas.
     O último livro de Ravitch, Vida e Morte do Grande Sistema Escolar Americano: como os testes padronizados e o modelo de mercado ameaçam a educação (Sulina, 2011) deve ser leitura obrigatória para professores e políticos que tomam decisões sobre os rumos da educação brasileira, pois é uma espécie de “tapa de luva” para quem imagina que a educação americana tem muito a nos ensinar.
     Estamos nos atrelando a algumas práticas e modelos educacionais de resultado bastante discutível, como a avaliação (e absoluta responsabilização) dos professores a partir do desempenho de seus alunos em testes padronizados e a abertura de capital privado na administração de escolas e instituições de ensino superior. Para alguns comentaristas, parte da solução para os graves problemas educacionais brasileiros é diminuir a interferência e controle do estado sobre os estabelecimentos de ensino, deixando que “empresários da educação” (não sei se esse profissional existe, mas creio que não deveria existir) apliquem a lógica do mercado no campo educacional. Não tenho muita experiência com isso, mas vivi algumas situações que me dizem que esse pensamento pode nos levar a um colapso social a partir da formação de profissionais de baixa qualificação e de rasa formação cultural, um perfeito exemplo da lógica “lucros individuais, prejuízos coletivos”. Quando se prioriza dinheiro em detrimento de qualidade da educação, em uma instituição educacional, é sinal de que algo está terrivelmente errado.
     Vida e Morte do Grande Sistema Escolar Americano apresenta uma argumentação detalhada e consistente, com extensas referências sobre as questões comentadas acima. Um ponto de destaque é que Ravitch era uma defensora de parte das políticas que hoje condena, e sua opinião mudou com a experiência cotidiana em instituições de ensino e através da observação de exemplos de como uma gestão empresarial da educação pode ser danosa a alunos e professores.
     Abaixo, transcrevo duas passagens do primeiro capítulo do livro que merecem a leitura e reflexão.

Há alguma coisa de confortadora sobre a crença de que a mão invisível do mercado, como Adam Smith a chamou, trará melhorias através de alguma força desconhecida. Na educação, essa crença nas forças do mercado permite que nós reles mortais saiamos da forca, especialmente aqueles que não descobriram como melhorar as escolas de baixa performance ou como romper com a lassidão de adolescentes desmotivados. Ao invés de lidar com problemas rancorosos, como de que forma ensinar a ler ou como melhorar a testagem, pode-se redesenhar a administração e a estrutura do sistema escolar e concentrar-se em incentivos e sanções. Não é preciso saber nada sobre crianças e educação. O apelo do mercado é a ideia de que a libertação das mãos do governo é a solução por si só. Essa ideia é muito tentadora, especialmente quando tantas reformas escolares aparentemente bem planejadas falharam em atender às expectativas.
     Os novos reformadores corporativos demonstram sua precária compreensão da educação construindo falsas analogias entre a educação e o mundo empresarial. Eles pensam que podem consertar a educação aplicando princípios de negócios, organização, administração, lei e marketing, e pelo desenvolvimento de um bom sistema de coleta de dados que proporcione as informações necessárias para incentivar a força de trabalho – diretores, professores e estudantes – com recompensas e sanções apropriadas.

É tempo, eu acho, de aqueles que querem melhorar nossas escolas focarem nos elementos essenciais da educação. Nós temos que garantir que as nossas escolas tenham um currículo forte, coerente e explícito, que seja enraizado nas artes e ciências, com muitas oportunidades para as crianças se engajarem em atividades e projetos que tornem o aprendizado vívido. Nós precisamos garantir que os estudantes ganhem o conhecimento que precisam para compreender debates políticos, fenômenos científicos e o mundo em que vivem. Nós precisamos nos certificar de que eles estão preparados para as responsabilidades da cidadania democrática em uma sociedade complexa. Nós precisamos cuidar para que nossos professores sejam bem educados, não apenas bem treinados. Nós precisamos ter certeza de que as escolas tenham a autoridade de manter tanto os padrões de aprendizado quando os padrões de comportamento.


     Currículos fortes em escolas, oportunidades reais de aprendizado, estudantes com senso crítico desenvolvido e com boas noções de cidadania, professores bem educados, e a autoridade nas escolas. Que sonho, não?

2 comentários:

  1. Oi, Guilherme

    Escrevi uma resenha sobre esse livro, publicada na revista Educação & Sociedade. Acho super importante divulgar, pois de fato representa uma lição para nossa política educacional brasileira. Está disponível no scielo em:
    http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-73302012000200017&script=sci_arttext
    abç
    Sara

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    1. Oi Sara,

      Obrigado pelo link! Já salvei seu trabalho, e em breve pretendo ler o artigo. Concordo com você que devemos divulgar essas ideias, pois quem sabe assim elas iluminem os responsáveis pela tomada de decisões na política educacional brasileira.

      Um abraço
      Guilherme

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