Comprei
no ano passado um livro extraordinário sobre animais, Animal Life (DK, 2008), de Charlotte Uhlenbroek. Animal Life é um guia visual sobre o
comportamento animal e sobre a enorme variedade de espécies que dividem o
planeta conosco, e é uma leitura mais do que recomendada para quem gosta de
aprender sobre a vida dos animais.
Há poucos dias, tirei esse livro da
estante e comecei a folheá-lo aleatoriamente. Enquanto observava as fotos, me
peguei pensando naqueles que foram o primeiro grande interesse da minha vida,
os animais. Desde pequeno, sempre fui fascinado por bichos. Nas viagens de
carro, era comum meus pais pararem o carro para que eu pudesse olhar um rebanho
de vacas pastando placidamente em algum campo. Quando visitava minha avó em
Veranópolis, uma atividade sagrada era pegar alguns ramos de funcho e ir até o
antigo seminário para alimentar as cabras e ovelhas que ficavam por lá. Eu
ficava completamente fascinado ao dar funcho aos bichos, que eram mais altos
que eu na época, e comiam até o saco de papel no qual eu colocava o alimento
deles. A jornada ficava completa, para mim, quando íamos depois ao clube de
caça e pesca, onde eu caminhava ao redor do lago e jogava pão aos patos e
gansos que nadavam por lá.
Minha admiração pela vida animal me
conduziu a outra paixão: os livros. Era Natal e eu devia ter em torno de uns 8
anos de idade. Meu pai pegou a filmadora e começou a registrar o pessoal da
família abrindo os presentes, animado, na sala da casa da minha avó em
Veranópolis. A câmera me enquadrou, sentado no sofá, com as pernas que sequer
chegavam perto de tocar o chão, segurando um grande pacote no colo, e muito
curioso. Comecei a abrir o pacote e vi uma caixa de papelão, na qual estava
escrito “Os Bichos”. Eu abri um pouco a caixa e percebi que “Os Bichos”, na
verdade, era uma coleção de livros sobre animais. Imediatamente olhei para a
câmera e gritei: “Mãe, olha! Os bichos! Os bichos!” A memória muitas vezes nos
prega peças, mas eu não hesitaria em dizer que foi um dos momentos de maior
euforia na minha vida. Uma coleção de livros sobre animais, o que mais uma
criança fascinada pelo assunto poderia querer?
Meu interesse pelos animais e pela
leitura segue até hoje, firme e forte, e um foi impulsionado pelo outro, como
em um ciclo de retroalimentação. Depois de guardar o livro de Uhlenbroek na
estante, fiquei satisfeito por ter tido uma infância bastante rica em estímulos
à minha curiosidade. Além de poder ver e interagir com animais em inúmeras
ocasiões, também tinha acesso a livros sobre eles (e com seis ou sete anos de
idade já sabia dos hábitos de animais como o babirusa, o gnu e o guepardo em
detalhes). O acesso e interesse pelos livros também se expandiram, e uma das
consequências disso pode ser vista neste blog, nos livros sobre os quais
comento.
No entanto, ao sentimento de satisfação
pela influência dos animais e dos livros em minha vida se seguiu um lamento.
Quantas crianças podem, hoje, ter uma infância realmente interessante, cheia de
estímulos ao intelecto? Vejo adultos pouco interessados em qualquer coisa que
não seja seu trabalho ou dinheiro, que não têm curiosidade em conhecer nada
além do que recebem passivamente pela TV, e que sequer fazem questão de
conhecer. Seus filhos, salvo milagre, crescerão de maneira parecida. É uma pena
que muitas crianças crescerão sem ter algo como “Os Bichos” por perto.
"Além de poder ver e interagir com animais em inúmeras ocasiões, também tinha acesso a livros sobre eles (e com seis ou sete anos de idade(...)"
ResponderExcluirMuito bom. É o tipo de "iniciação" que toda criança deveria ter para chegar ou continuar nos primeiros anos da escola.