terça-feira, 15 de maio de 2012

Os bichos, os livros e eu

Por Guilherme

Comprei no ano passado um livro extraordinário sobre animais, Animal Life (DK, 2008), de Charlotte Uhlenbroek. Animal Life é um guia visual sobre o comportamento animal e sobre a enorme variedade de espécies que dividem o planeta conosco, e é uma leitura mais do que recomendada para quem gosta de aprender sobre a vida dos animais.
      Há poucos dias, tirei esse livro da estante e comecei a folheá-lo aleatoriamente. Enquanto observava as fotos, me peguei pensando naqueles que foram o primeiro grande interesse da minha vida, os animais. Desde pequeno, sempre fui fascinado por bichos. Nas viagens de carro, era comum meus pais pararem o carro para que eu pudesse olhar um rebanho de vacas pastando placidamente em algum campo. Quando visitava minha avó em Veranópolis, uma atividade sagrada era pegar alguns ramos de funcho e ir até o antigo seminário para alimentar as cabras e ovelhas que ficavam por lá. Eu ficava completamente fascinado ao dar funcho aos bichos, que eram mais altos que eu na época, e comiam até o saco de papel no qual eu colocava o alimento deles. A jornada ficava completa, para mim, quando íamos depois ao clube de caça e pesca, onde eu caminhava ao redor do lago e jogava pão aos patos e gansos que nadavam por lá.
      Minha admiração pela vida animal me conduziu a outra paixão: os livros. Era Natal e eu devia ter em torno de uns 8 anos de idade. Meu pai pegou a filmadora e começou a registrar o pessoal da família abrindo os presentes, animado, na sala da casa da minha avó em Veranópolis. A câmera me enquadrou, sentado no sofá, com as pernas que sequer chegavam perto de tocar o chão, segurando um grande pacote no colo, e muito curioso. Comecei a abrir o pacote e vi uma caixa de papelão, na qual estava escrito “Os Bichos”. Eu abri um pouco a caixa e percebi que “Os Bichos”, na verdade, era uma coleção de livros sobre animais. Imediatamente olhei para a câmera e gritei: “Mãe, olha! Os bichos! Os bichos!” A memória muitas vezes nos prega peças, mas eu não hesitaria em dizer que foi um dos momentos de maior euforia na minha vida. Uma coleção de livros sobre animais, o que mais uma criança fascinada pelo assunto poderia querer?
      Meu interesse pelos animais e pela leitura segue até hoje, firme e forte, e um foi impulsionado pelo outro, como em um ciclo de retroalimentação. Depois de guardar o livro de Uhlenbroek na estante, fiquei satisfeito por ter tido uma infância bastante rica em estímulos à minha curiosidade. Além de poder ver e interagir com animais em inúmeras ocasiões, também tinha acesso a livros sobre eles (e com seis ou sete anos de idade já sabia dos hábitos de animais como o babirusa, o gnu e o guepardo em detalhes). O acesso e interesse pelos livros também se expandiram, e uma das consequências disso pode ser vista neste blog, nos livros sobre os quais comento.
      No entanto, ao sentimento de satisfação pela influência dos animais e dos livros em minha vida se seguiu um lamento. Quantas crianças podem, hoje, ter uma infância realmente interessante, cheia de estímulos ao intelecto? Vejo adultos pouco interessados em qualquer coisa que não seja seu trabalho ou dinheiro, que não têm curiosidade em conhecer nada além do que recebem passivamente pela TV, e que sequer fazem questão de conhecer. Seus filhos, salvo milagre, crescerão de maneira parecida. É uma pena que muitas crianças crescerão sem ter algo como “Os Bichos” por perto.

Um comentário:

  1. "Além de poder ver e interagir com animais em inúmeras ocasiões, também tinha acesso a livros sobre eles (e com seis ou sete anos de idade(...)"

    Muito bom. É o tipo de "iniciação" que toda criança deveria ter para chegar ou continuar nos primeiros anos da escola.

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