domingo, 14 de outubro de 2012

A Desobediência Civil

Por Guilherme

Em 1846, o americano Henry David Thoreau foi preso por uma noite por recusar-se a pagar os impostos que devia ao governo americano. O motivo da recusa era que Thoreau pensava que seu dinheiro ajudaria a financiar a guerra que os Estados Unidos travavam com o México, além da manutenção de escravos em fazendas americanas. Em relação ao governo, Thoreau era adepto da máxima “o melhor governo é o que menos governa”, que levaria a “o melhor governo é o que absolutamente não governa”, considerando que tivéssemos uma sociedade composta por homens de “virtude”, como Thoreau costumava escrever.
    A consciência daquilo que é certo e errado, dizia Thoreau, é a nossa melhor arma contra indivíduos que usam o governo como seu instrumento (qualquer semelhança com o que vemos hoje, no Brasil e em diversos lugares do mundo, não é mera coincidência). Contra as injustiças, afirmava o filósofo, é necessário fazer algo, por menor e menos impactante que possa parecer. A Desobediência Civil, escrita em forma de um curto ensaio, foi a maneira de Thoreau se manifestar, não só contra o governo, mas contra o estilo de vida de sua época, a hipocrisia, o interesse próprio e a complacência de seus contemporâneos em relação a práticas como a corrupção. Nunca li algo tão poderoso e contundente em menos de 40 páginas. E atual também, apesar de escrito em 1849.

Falando em termos práticos, os adversários de uma reforma em Massachusetts não são 100 mil políticos do Sul, mas 100 mil comerciantes e fazendeiros daqui, que estão mais interessados no comércio e na agricultura do que na humanidade, e não estão preparados para fazer justiça aos escravos e ao México, custe o que custar.

Há muitos que, considerando-se filhos de Washington e Franklin, ficam sentados de braços cruzados e dizem não saber o que fazer, e nada fazem; muitos que até mesmo subordinam a questão da liberdade à questão do livre-comércio, e que lêem tranquilamente, depois do jantar, as cotações do dia junto com as notícias vindas do México, e possivelmente adormecem sobre ambas. Quanto vale um homem honesto e patriota nos dias de hoje? Eles hesitam, lamentam e às vezes reivindicam; mas não fazem nada a sério e para valer. Esperarão, com boa vontade, que outros curem o mal, para que eles não mais tenham que lastimá-lo. Na melhor das hipóteses, eles se limitarão a dar um voto fácil, um débil apoio e um desejo de boa sorte aos corretos, quando a ocasião se apresentar.

Não é obrigação de um homem, evidentemente, dedicar-se à erradicação de um mal qualquer, nem mesmo do maior que exista; ele pode muito bem ter outras preocupações que o absorvam. Mas é seu dever, pelo menos, manter as mãos limpas e, mesmo sem pensar no assunto, recusar o apoio prático ao que é errado. Se eu me dedico a outros planos e atividades, devo antes de mais nada garantir, no mínimo, que para realizá-los não estarei pisando nos ombros de outro homem. Devo sair de cima dele para que também ele possa perseguir seus objetivos.

    Recomendo a leitura da última edição brasileira de A Desobediência Civil, lançada em 2012 pela Companhia das Letras – Penguin. Além do manifesto A desobediência civil, a obra conta com outros quatro textos, entre eles o ótimo Vida sem princípios, ensaio no qual Thoreau crítica a ideia de que o trabalho deve ser uma finalidade em nossas vidas, e elogia a vida contemplativa e mentalmente sã.

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